sexta-feira, 24 de abril de 2015

Entrevista - Eu me ofereço! Um tributo a Stephen King (Contos de Terror)


Autores selecionados para a entrevista:

Mauricio R B Campos – http://www.mauriciorbcampos.com.br
Marcio Muniz - http://zip.net/bwq7v0

Saber o que certos autores pensam é sempre interessante. Mas nem sempre queremos saber somente o básico, queremos mais, queremos saber como tudo começou, se querem viver da arte de escrever e se escritores de terror são na verdade "terroristas"..rsrs.. 
Vamos descobrir?


1.       Quando você escreveu um texto literário pela primeira vez?

TJ Nicodemus - Existe aquele velho clichê de se dizer que escreve desde pequeno e que praticamente nasceu para isso. Bem, não fujo dessa realidade, sempre gostei de criar histórias que iam desde os gibis até o terror que adoto atualmente, mas a primeira vez que escrevi almejando a publicação foi a cerca de quatro anos atrás, com meu primeiro romance, O Condado.

Rafael Valore - Eu sempre me interessei por literatura desde pequeno, e sempre fui bem em redação na escola. As minhas notas de redação e inglês sempre foram as que me impulsionaram instituição adentro nos vestibulares que prestei. Entretanto sentar-me de frente para a tela em branco com a decisão de escrever algo que tivesse a responsabilidade e a pretensão de ter uma qualidade profissional aconteceu apenas por volta de 2012, 2013.

Mauricio R B Campos - Para mim, a arte da ficção está ligada aos processos imaginativos e lúdicos. Paralelo a isso sempre fui um leitor voraz, e os primeiros autores que me influenciaram foram Frank Herbert, Ernest Hemingway e Machado de Assis. A primeira poesia que escrevi com qualidade literária foi inspirada em um jogo de RPG, isso em 1999. Eu enviei essa poesia para um web site especializado no RPG e recebi um feedback legal. Daí em diante não parei mais. É claro que nesses últimos anos aprimorei muito meu texto, participei de dezenas de antologias, e, o mais importante: fiz muitos amigos nessa jornada.

Marcio Muniz - Escrevi vários cerimoniais de minhas amigas que completavam então 15 anos e faziam festas de debutante. Nessa época, eu também escrevia diálogos para histórias em quadrinho que um amigo meu de colégio desenhava e depois vendíamos aos colegas. Com menos de 20 anos de idade eu tinha 4 contos escritos e um dia me veio o desafio: "Preciso escrever uma história, um livro" Comprei um caderno de 100 páginas e em duas semanas eu tinha criado a história, ainda inédita. Tudo manuscrito. hoje tenho quatro romances prontos, vários contos e cerca de umas 500 poesias que até 2014 eu guardava só para mim.

2.       O que é o ato de escrever para você?

TJ  Nicodemus  - Dizem que a única coisa que somos literalmente obrigados a fazer é se alimentar e respirar, no entanto, vejo que para alguns escritores – e me incluo nesse meio – escrever entraria nessa lista como algo essencial. As ideias fervilham na minha cabeça e certamente me enlouqueceriam se de alguma forma eu não pudesse transferi-las para outro lugar, o papel. Hoje, sem dúvidas, posso afirmar que escrever faz parte do que sou. É minha essência.

Rafael Valore - Escrever é expor medos, falhas e qualidades morais, transportar o leitor para dentro do meu mundo de sombras e pequenas vitórias.

Mauricio R B Campos - Escrever é minha grande paixão. Escrevendo eu não só crio, como descubro outras facetas da vida em cada nova personagem que vai para o papel. Agora, por exemplo, estou escrevendo um conto sobre um DJ. Então em minhas pesquisas descobri que o mercado de música eletrônica movimentou 3 bilhões ano passado, que hoje os DJS podem usar três tipos de aparelhagem de som, as CDJ's, notebooks ou LP's. Aprendi sobre os principais nomes da cena eletrônica e como funciona um festival como o Tomorrowland. Então, é isso, aquele chavão de ser escritor é viver muitas vidas é muito verdadeiro para mim.

Marcio Muniz - O ato de escrever para mim é uma libertação, uma forma que tenho de dar vazão aos meus sentimentos, viajar, devanear e simplesmente vivenciar uma série de situações. Eu não consigo me deixar de ver em cada história que escrevo, seja como mero observador, mas a maioria das vezes como personagem, uma espécie de alter ego. Escrever para mim sempre foi não uma fuga, mas um reencontro comigo mesmo.

3.       Porque escrever terror? Isso não te assusta ou deprime de alguma forma?

TJ Nicodemus  - O Terror é uma válvula de escape. De certa forma colocamos no papel aquilo que não queremos encontrar nunca na vida real. Nossos medos. Nossos pesadelos. É como se disséssemos ao leitor: Toma tua dose literária de terror que isso lhe imunizará (ou amenizará) os teus terrores reais diários. Existe uma antiga lenda que conta a história de dois irmãos videntes, um visualiza tudo de bom que acontecerá no futuro e o outro vê apenas as coisas ruins. A lógica normal nos diria que aquele visionário das coisas ruins seria triste e deprimido, porém ele se mostra muito mais feliz que o seu gêmeo, isso porque o terror de suas visões lhe prepara para o pior que pode existir, e sempre que algo não tão ruim acontece ele sente-se feliz e aliviado. É assim que me sinto.

Rafael Valore - Eu confesso que em algum ponto enjoamos de sangue, sangue, sangue. Se estiver deprimido às vezes não consigo trabalhar com temas muito perturbadores, e engaveto o conto por algum tempo. Por isso mesmo comecei a escrever algumas crônicas voltadas para minha experiência com a religião católica. Infelizmente nem nisto eu escapo do horror e do sobrenatural; foi de certa forma como Deus me ajuntou, ele mandou o diabo me apoquentar.   Mas em geral posso manter distanciamento do tema, posso entrar e sair da mente do personagem à vontade. As vezes posso sublimar uma dor muito forte através da escrita, às vezes não consigo concentração o suficiente para escrever. Na minha opinião, o gênero de terror é somente uma linguagem como todas as outras, que eu uso como metáfora para as coisas da vida diária, o amor, a desilusão, a fome e a saciedade, os bons e os maus momentos.    Um artista plástico e visual chamado Patrick Woodroffe sempre teve um sonho com um monstro desde a infância; quando ele desenhou a criatura no papel, parou de sonhar com ela. Ponha o monstro no papel e verá que ele não é tão ameaçador assim. Destarte não enxergo diferença temática essencial entre a música e a poesia da banda Black Sabbath, por exemplo, com o cuidado do escultor medieval que cria uma gárgula perfeita, e que será colocada num ponto tão alto da catedral gótica que ninguém nunca irá ver, esculpindo o horror, mas sempre em honra de Deus.  Não aconselho que crianças leiam meus textos, entretanto.

Mauricio R B Campos - O terror é o mais primitivo dos sentimentos, e mergulhar em uma história de terror é como resgatar sensações perdidas na ancestralidade do nosso lado animal. Esse mergulho controlado no medo, no qual você sabe que quando fechar o livro não haverá um assassino esperando, é um tipo de prazer.

Marcio Muniz - Na verdade, terror é um gênero que gosto muito de ler mas que não tenho o mesmo êxito em escrever.  Conheci muitas histórias do Stephen King no cinema, antes de nos livros, sem sequer saber que eram dele. Escrever terror para mim hoje é na verdade um grande desafio.

4.       Você se identifica com outro gênero além do terror? Qual?

TJ Nicodemus - Minha veia essencialmente dramática é que me levou a escrever terror. O que seria mais dramático do que ver um ente querido sendo desfigurado por um monstro ou Serial killer? Os distúrbios psicológicos ocasionados por tais eventos me fazem optar pelo drama como um dos meus gêneros preferidos.

Rafael Valore - Claro, com um pouco de todos. Eu garanto que eu posso encontrar pelo menos um escritor que eu goste em cada gênero literário que existe. Gosto de coisas que flertam com mais de um gênero, sem limites muito definidos. A obra de Thomas Mann, por exemplo, acho difícil catalogar.

Mauricio R B Campos - Eu tento não me prender a gêneros. Escrevo em todos os gêneros. Já escrevi aventura, mistério, alta literatura, ficção científica, erótico, e agora estou me aventurando no romance. Para mim a grande vantagem das antologias é essa, possibilitar experimentações literárias sem que o autor precise se dedicar por meses na confecção de um romance.

Marcio Muniz - Na verdade gosto de retratar o cotidiano mas sempre dando a ele um quê de surreal, bem sutil, fazer as pessoas pensarem: "ah, mas isso não é possível!" e logo em seguida se questionarem: "Por que não?". Por ser muito romântico também gosto muito de histórias de amor.

5.     No Brasil, para você, escrever pode ser uma profissão algum dia?

TJ Nicodemus - O Brasil enxergou tardiamente o mercado literário nacional como algo lucrativo, e isso acabou por não incentivar bons escritores a focar apenas nessa profissão. Hoje, com o surgimento de novas modalidades de publicação, o horizonte passou a ser algo possível de alcance. Logicamente ainda temos muito que evoluir, mas certamente, quando deixamos de apenas publicar os best-sellers estrangeiros, passaremos a ver o potencial do nosso mercado, e saberemos reconhecer o autor nacional com o prestígio que ele merece. Muito em breve.

Rafael Valore - Eu sonho com isso.

Mauricio R B Campos - Não tenho ilusões quanto a isso. Contam-se nos dedos os autores que conseguem alcançar esse patamar no Brasil hoje em dia. Eu escrevo por que gosto e tento alcançar o melhor público leitor que conseguir. Sou bem realista quanto a isso hoje. Já existem autores talentosos como o Jacques Barcia e o Carlos Orsi, por exemplo, que submetem seus trabalhos em inglês direto para editoras americanas buscando um lugar ao sol em um país que têm mercado.

Marcio Muniz - Por enquanto isso para mim não passa de um sonho. Em nosso país é bem complicado ser reconhecido e principalmente viver de literatura, mas quem sabe um dia, né? Afinal, são nossos sonhos que constroem nossa realidade futura. Por enquanto, me contento em ser lido, que para mim no fundo, deve ser o principal objetivo de um escritor.

6.       Escrever em antologia paga por regime de cooperativa-cota é vantajoso para você? Por quê?

TJ Nicodemus - Para mim de fato é, pois optei por uma editora que preza pela divulgação do escritor e de seu trabalho através do investimento em feiras, traduções, bienais e outros eventos, mas infelizmente o que vemos hoje dia é que essa postura é algo raro no mercado editorial, isso porque o principal objetivo de algumas editoras é apenas servir de gráfica, imprimindo o livro e embolsando o lucro. Por isso é essencial observar o objetivo da editora ou do projeto, antes de desprender tempo e dinheiro em algo que não lhe proporcione o devido reconhecimento.

Rafael Valore - Claro, eu me sinto um escritor agora. Eu fui publicado, eu fui lido, eu fui resenhado. Isto é o começo que encontrei, e sei que foi Deus que colocou meus colegas de antologias e a organizadora em meu caminho. Eu ainda não sou um profissional pago, e talvez nunca venha a ser, mas começo a obter um pouquinho de reconhecimento; a sensação é grande de saber que tem contos meus em bibliotecas em Portugal e Argentina, por exemplo.

Mauricio R B Campos - Acredito ser vantajoso pelo motivo que já citei, da experimentação, e acrescento a esse outro que acho melhor: o networking. Nós somos o futuro da literatura brasileira, essa é a verdade, que a literatura independente nacional será o que fizermos dela. Então o colega de antologia paga de hoje poderá ser o organizador de uma antologia por uma editora que banque esse processo amanhã. Isso já aconteceu comigo e é uma realidade do mercado hoje. Dezenas de antologias são lançadas todos os anos no Brasil atualmente, mas a grande maioria dos autores desiste quando descobre que a realidade do escritor brasileiro não é tomar uísque em frente ao computador e receber cheques polpudos das editoras. Os que perseveram são os que herdam o mercado.

Marcio Muniz - Escrever nesse regime pode parecer para alguns, um sinal de demérito, tipo "o cara tem que pagar para lançar!" e isso é um pensamento pequeno, principalmente em nosso país. Há antologias e antologias. No caso do grupo Antologias brasileiras, escrever assim é um imenso prazer devido a qualidade dos textos, dos trabalhos e do processo de seleção a qual somos submetidos. Além de aprender com outros autores, conhecer outros estilos, ser lido por um número maior de pessoas e ser desafiado por cada novo tema proposto. Sim, para mim é muito vantajoso, ainda que em termos de retorno financeiro não seja uma grande opção, as demais vantagens justificam e muito escrever sob esse tipo de regime.

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